Sorriso da alma - EU CURTO SER MÃE

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Sorriso da alma



"Você vai voltar a sorrir". Eu arrepiava quando ouvia essa frase, logo que meu filho morreu. A dor que eu sentia era tão profunda que eu simplesmente não conseguia imaginar que em algum outro dia na vida eu fosse conseguir ser feliz novamente. As pessoas me diziam isso, com uma irritante certeza. E eu, não só duvidava, como odiava ouvir isso. 

Durante muito tempo, eu realmente não tive vontade de sorrir, nem mesmo de abrir a boca para falar eu tinha vontade. Aliás, nem de levantar da cama. Foi o momento mais duro, muito confundido com depressão, mas normal em situações como a que vivi: a morte de um filho. 

Foi passando o tempo e eu me levantei, mas ainda não tinha vontade de me prolongar em diálogos. Logo fiquei grávida da Lola e, ao contrário do que se imaginava, eu também não consegui ficar feliz. Eu tinha mais medo do que tudo. Medo dela morrer, medo de acontecer novamente. Medo! Não sorri durante a gravidez. No máximo, respirei aliviada após algum ultrassom com doppler. Lola nasceu e meu sorriso veio, largo e frouxo, como havia de ser. Mas uma coisa me incomodava toda vez que eu via alguma foto minha: meus olhos diziam o contrário. Havia um peso no olhar, uma dor pulando do que chamam janela da alma. 

Sim, eu estava muito feliz com minha filha. Muito! Eu domestiquei minha dor para que eu pudesse vivenciar a maternidade. Eu precisei me reinventar para sobreviver à tragédia que vivi.  Com o passar do tempo, depois de administrar as mudanças que um bebê nos impõem, eu voltei a explorar outros prazeres da vida. Curtir o marido, sair com amigos, ler um bom livro, ouvir música... Enfim, eu era praticamente aquilo que eu fui antes da partida do meu filho Francisco. Mas olhava minhas fotos e lá estava aquele olhar desmentindo a boca. 

Me conformei. Eu voltei a sorrir com o corpo, mas não voltarei com a alma. Fim, vida que segue. E parei de pensar no assunto. Até que, quatro anos e alguns dias depois, uma foto minha com a Lola revelou o que eu já não esperava: meus olhos estavam sorrindo. Surpresa!

A dor da morte do meu filho ainda existe. E como existe.... Eternamente eu sentirei falta do que não foi e lamentarei pelo que aconteceu. Metade de mim se apagou. Mas quando Lola nasceu, eu decidi que, com ela e por ela, eu voltaria a ser feliz com a outra metade que restou. 

Este texto, meus queridos, é dedicado às mães de anjos que perderam seus corações recentemente. As pessoas vão dizer: você vai voltar a sorrir. Sim, vai. Mas não se cobre. Vem quando tiver que vir, da forma que tiver que ser, no seu tempo. E saber que num futuro seus sorriso voltará, não anula, em hipótese alguma, a dor terrível que você está vivendo. Dói muito, muito mesmo. Dói mais do que qualquer outra coisa. Deixe a dor doer até quando ela quiser. Depois, ela vai encontrar seu lugar, vai incomodar ainda por muito tempo, mas ela vai ficar quietinha para que você volte, merecidamente, a sorrir. Por que mãe de anjo tem direito de ser feliz novamente.  

4 comentários:

  1. Leticia, eu sinto muito pela perda do seu filhinho Francisco... eu perdi meu bebe em dezembro do ano passado, e me identifiquei muito com o seu texto... e realmente impossivel acreditar que irei sorrir novamente, por mais de 3 segundos de uma vez, que chegara um dia inteiro sem lagrimas.. mas seu texto me deu um pouco de esperanca. Um abraco!!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Cristiane, um forte abraço para você.

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  4. Deus é com você e toda mãe de anjo.

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